sábado, 24 de julho de 2010

NOSSA NOVELA DE CADA DIA

Outro dia aconteceu-me algo estranho. Fui fechar uma conta num banco. Era uma destas contas-salário, que a empresa abre para efetuar o depósito de seu salário. O problema é que em minha trajetória profissional mudei de emprego algumas vezes e acabei esquecendo de fechar esta conta. Pois bem, gerou um saldo devedor absurdo e eu tinha que resolver. Ontem cheguei nesta agência disposto a falar com a gerente e resolver o assunto. A coitada estava toda enrolado com um financiamento de imóvel de seu cliente. O contrato tinha um valor e o financiamento era outro. Algo simples de se resolver, mas pelo visto ocuparia toda a tarde e já eram 11:50 hs. Ela disse que só poderia me atender depois e provavelmente não seria naquele dia. Disse ainda que eu poderia inclusive reclamar no 0800. É claro que eu não faria isso.
Voltei no dia seguinte (hoje) disposto a encerrar a conta. Ela, muito simpática, perpiscaz, convenceu-me do contrário. Disse que era uma injustiça aquele saldo devedor e que sentia muito. Continuei com a conta e ganhei isenção de tarifas. Ela não sabia, mas era o que havia planejado. Enquanto atualiza meu cadastro perguntei-lhe como a negociação de ontem terminou. Simplesmente não terminou e será concluída depois. Agradeceu pela minha paciência e serenidade, uma vez que não reclamei e voltei no dia seguinte para resolver meu problema. Perguntou-me qual era a minha religião.
- Ultimamente não tenho freqüentado a igreja.
- Mas não lhe perguntei sobre igreja. Poderia ser um templo ou uma casa espiritual. Mas você parece ser tão sereno. Pensei que fosse cristão.
- Mas tenho muita fé, mesmo sem freqüentar algum templo, igreja, sei lá.
- Também é um defeito que tenho. Não freqüento nenhuma casa religiosa. Acho que não tenho religião.
- Mas quem disse que precisamos. Acho que faz bem de fato, mas não é isso que define nosso caráter e comportamento. Você mesmo deve conhecer tanta gente invejosa que freqüenta igrejas. Não é necessário a igreja para formar o caráter da pessoa. A igreja e a religião ajudam, mas a proximidade com ELE é definida por nossos atos.
E assim seguiu-se a conversa. Já eram mais ou menos 13:30 hs. Fomos almoçar. Estranhei o convite da gerente, mesmo assim aceitei. Você deve estar pensando que rolou algum clima. Rsrsrs. Ela é mesmo muito bonita, atraente. Parece ser interessante também. Mas na minha cabeça só tem uma mulher.
Voltemos ao almoço. De repente, do nada, ela começou a me contar seu drama pessoal. Ela, uma mulher bonita e bem sucedida de 39 anos. Casada há 19 e três filhos com o mesmo marido. Ele, a ama loucamente. Sente excitação por ela todos os dias. E ela não o ama mais. A relação desgastou pela própria evolução da sociedade. Hoje a mulher é dona de seu próprio nariz. Ela é forte, guerreira e destemida. O homem para ter essa mulher ao seu lado deve brigar todo dia por ela. Deve crescer junto com ela. Deve partilhar de suas ambições. Ela não quer que ele ganhe mais ou menos que ela. Quer que ele não pare de crescer. Além disso, ela ainda quer que ele seja um bom amante. Quer ser desejada, mas também quer que ele desperte nela as sensações mais doces de prazer. É preciso dar cambalhota e efetuar malabarismos no lustre. É preciso ser super-homem e esse marido não é o super-herói que ela deseja.
É impressionante como o ser humano gosta de transformar suas vidas em novelas globais. Decisões que deveriam ser simples, complicamos de uma forma absurda. É claro que ela não conversou sobre seus sentimentos com o marido. É claro que sua angustia aumentou e arrastou-se. É claro que apareceu alguém para cobrir a lacuna vazia em seu coração. E o ser humano ainda é capaz de complicar ainda mais.
De novela global, transformamos em dramalhão mexicano. Esse que preencheu a lacuna, começou a freqüentar a casa e virou amigo da família, inclusive do marido. É, virou tragédia grega. É claro que não lhe dei conselhos. Não o que falar. Apenas disse que ela decida pelo coração. Seja qual for a decisão que ela tome, a razão irá condená-la, mas o coração irá confortá-la.
Por que gostamos tantos de dramas? Por que complicamos tanto? Na maioria das vezes a entrega é inevitável. Seja um amor, emprego ou um abraço a um amigo. Mesmo assim adiamos a decisão, transformando felicidade em angústia. É a própria novela de Manoel Carlos.
É preciso saber viver.

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